Proteina vegetal: muito além da soja
É impressionante como nos dias de hoje
ainda sabemos pouco sobre os alimentos que comemos. Já cansei de escutar
pessoas dizendo que só tem proteínas em produtos de origem animal,
quando um mínimo de conhecimento em nutrição seria suficiente pra
entender que o mundo vegetal também está repleto de proteínas. Outro
mito é imaginar que proteína vegetal significa soja e nada mais.
Outro dia estava vendo a versão online de
uma revista de curiosidades científicas pra jovens e quase caí pra trás
quando li a matéria “Dá pra viver bem sem carne?”.
A resposta da nutricionista foi: “Sim, mas o menu verde não pode ser
muito radical” (entenda, não deve ser vegano). Segundo a matéria uma
alimentação saudável tem que ter de tudo um pouco, inclusive carne
e a dieta vegetariana é “fraca” em quatro nutrientes: ferro, B12,
cálcio e proteína. O que mais me indignou foram algumas das “soluções”
sugeridas pela matéria, como por exemplo tomar 3 copos de leite por dia
pra ter cálcio suficiente (veganos e intolerantes à lactose, vocês não
têm alternativa). Mas a maior pérola da matéria foi a solução pra ter
proteína suficiente na dieta: “Comer muita soja, único vegetal que supre
100% das necessidades protéicas.” Já falei sobre a B12 aqui
e falarei do cálcio e ferro outro dia, mas hoje gostaria de esclarecer
essa história de proteína de uma vez por todas porque não gosto que
saiam falando mal do veganismo por simples preconceito ou falta de
conhecimento.
Quantidade
Primeiro de tudo, qual a quantidade de
proteína que precisamos por dia? Resposta: os nutricionistas recomendam
entre 0,8gr e 1gr de proteína por quilo de massa corpórea. Mas estamos
falando do seu peso ideal, então cuidado no cálculo se você estiver
acima ou abaixo do peso. Uma pessoa que pesa 60kg precisa (fazendo a
média) de 55gr de proteína por dia. Deficiência de proteína é algo
raríssimo, muito mais provável de acontecer nos países devastados pela
fome do que na nossa sociedade superalimentada. E nem precisa sair
contando proteína: se você estiver ingerindo calorias suficientes,
vindas de alimentos nutritivos e variados, estará ingerindo proteínas
suficientes. Claro que se uma grande parte das calorias da sua dieta
vier de batata frita, refrigerante, chocolate e biscoito isso será um
problema, mas com uma alimentação saudável (evite alimentos
industrializados) e variada (coma de tudo um pouco) ninguém corre o
risco de desenvolver deficiência em proteína e isso também é válido pros
veganos. Outro mito é achar que proteína nunca é demais: excesso de
proteína é prejudicial à saúde. Diversos estudos mostraram que os
brasileiros estão ingerindo mais proteínas do que o recomendado. Nos
EUA, cada americano ingere de 2,5 a 4 vezes mais proteínas do que
deveria! Quando há excesso de proteína na corrente sanguínea ela é
degradada e armazenada na forma de gordura. Proteína demais também deixa
o organismo mais ácido e o corpo vai buscar minerais, como o cálcio dos
ossos, pra combater a acidez. Resultado: aumenta a excreção de cálcio, o
que eleva o risco de desenvolver doenças como osteoporose.
Qualidade
As proteínas são formadas por blocos
menores, os aminoácidos. Existem nove aminoácidos que não são
sintetizados pelo corpo, chamados de aminoácidos essenciais, e a única
maneira de obtê-los é através da alimentação. Produtos de origem animal,
como carne, leite e ovos, possuem todos os aminoácidos essenciais, sendo considerados proteínas completas. Enquanto tem vegetais
que também são proteínas completas, como a soja, a quinoa, o amaranto,
as sementes de chia, a spirulina (alga) e o trigo sarraceno, a grande
maioria não possui quantidades boas de todos os aminoácidos ao mesmo
tempo. Porém, a combinação de vegetais
de grupos diferentes garante a ingestão de todos os aminoácidos. Nem
precisa ser na mesma refeição: estudos mostraram que seu corpo é capaz
de combinar aminoácidos em um período de 24 horas. É muito simples,
basta combinar uma leguminosa (feijão, grão de bico, lentilha, ervilha)
com um cereal (trigo, milho, arroz, aveia) durante o dia e pronto, você
tem uma proteína completa. Por exemplo, nosso feijão com arroz diário é
uma proteína vegetal completa. O feijão com milho dos mexicanos também,
assim como as lentilhas com arroz dos indianos e o grão de bico com
trigo dos árabes. Não é curioso como a comida de base de vários povos do
mundo é uma combinação de leguminosas e cereais, formando uma proteína vegetal completa e tornando a carne
dispensável? Outras combinações que formam proteínas completas são
leguminosas com sementes (de girassól, abóbora, gergelim…) e leguminosas
com frutas oleaginosas (castanhas, nozes, amêndoas…). O meu amado hummus (pasta de grão de bico com gergelim), por exemplo, também é uma proteína completa. Embora seja comum se referir às proteínas vegetais
como “inferiores”, elas na verdade tem muitas vantagens quando
comparadas às proteínas animais, pois não contêm colesterol, são pobres
em gordura ruim e têm duas coisas importantíssimas pra saúde e que não
existem nos produtos de origem animal: fitoquímicos (um tipo de
antioxidante) e fibras. Esqueça os velhos mitos, proteína vegetal é de
ótima qualidade!
Onde encontrar
Proteínas estão presente em todos os alimentos vegetais,
o que varia é a quantidade. Sim, a soja é riquíssima em proteínas (e
completas!), mas ela não é a única. O melhor substituto da carne são as leguminosas, então ignore as salsichas vegetais
(caríssimas e altamente processadas/industrializadas) e a proteína de
soja (onipresente na dieta de alguns vegs) e inclua feijão, lentilha,
grão de bico e ervilha no seu cardápio diário. Outros alimentos vegetais
ricos em proteína: cereais integrais, amendoim, oleaginosas, sementes e
tofu (o meu derivado da soja preferido). Como você pode ver, a soja não
é o único alimento vegetal capaz de suprir suas necessidades em
proteínas.
Eu não ando com uma tabela nutricional na
bolsa, nem passo o meu tempo contando proteína (nem nenhum outro
nutriente) e ninguém precisa fazer isso. Mas depois de tanto pensar
nesse assunto, resolvi fazer um prato super rico em proteínas, prático e
gostoso. Eu já falei várias vezes e vou repetir: ninguém precisa de
ingredientes exóticos pra ter uma alimentação saudável e feijão com
arroz é uma proteína vegetal completa. Mas é fato que a quinoa é rica em
proteínas (completas) e misturada com feijão você obtém uma refeição
altamente nutritiva e proteinada. É difícil calcular o valor nutricional
dos alimentos pois os dados variam ligeiramente de acordo com a fonte
consultada (principalmente no caso da quinoa), mas fazendo a média minha
salada de feijão tem, por porção (só estou contando os nutritentes da
quinoa e do feijão) 23gr de proteína. Soma-se a isso 20gr de fibras
(adultos devem consumir de 25gr à 35gr de fibras por dia), boas doses de
ferro, manganês, magnésio, fósforo e folato. Quem ainda ousar falar mal
de proteína vegetal ou disser que vegano não sobrevive sem soja vai
levar cascudo!
Salada de quinoa e feijão preto com vinagrete de laranja
Cheia de proteína, fibras e minerais,
essa salada é um delicioso prato completo que alimenta e nutre sem pesar
no estômago. A vinagrete de laranja realça os sabores e ajuda, graças à
vitamina C, na assimilação do ferro. Se não tiver laranja pode
substituir por suco de limão a gosto. Amigos celíacos, quinoa não tem
glúten.
2x de feijão preto cozido (sem caldo, temperado com sal)
3/4x de quinoa crua (um pouquinho mais de 2x cozida)
½ pimentão vermelho picado
2 cebolinhas picadas (parte branca e um pouco do verde)
4 dentes de alho picados
1 tomate picado
1cc de cominho em pó
3 cs de azeite
1/3x de suco de laranja
1 punhado de coentro picado
sal e pimenta do reino a gosto
Leve ao fogo a quinoa, 1 1/2x de água e
uma pitada generosa de sal. Quando começar a ferver baixe o fogo e
cozinhe até a quinoa ficar macia e a água se evaporar completamente.
Aqueça 1cs de azeite e doure o alho. Junte o cominho e frite durante 1
minuto. Junte o feijão e a quinoa e misture bem. Desligue o fogo e deixe
esfriar um pouco. Junte o pimentão, a cebolinha, o tomate, o suco de
laranja misturado com 2cs de azeite, o coentro, uma pitada de sal e
outra de pimenta do reino. Mexa delicadamente, prove e corrija o
tempero. Sirva a salada morna ou em temperatura ambiente. Rende 2
porções generosas como prato principal.
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